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quinta-feira, 27 de maio de 2010

As proezas de João Grilo e Zé Pitada.

Livrinho de cordel - O encontro de Cancão de Fogo com Pedro Malazarte.
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Já conversamos anteriormente sobre Literatura de Cordel, popular e eminentemente nordestina, que marcou muito a minha infância, pois meus tios compravam livrinhos semanais ou mensais, não lembro, que eu devorava com gosto. Não havia televisão naquela época. Ou se havia, era no eixo Rio/São Paulo e somente para ricos.
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Com os senhores duas histórias de cordel: a de João Grilo e a do Zé Pitada. Foram tiradas da coleção Literatura Comentada - Autores de Cordel - da Abril Educação, textos selecionados por Marlyse Meyer.
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JOÃO GRILO
Editor: João Martins de Athayde.
Autor: João Ferreira de Lima.

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No ano em que João nasceu
houve um eclipse da lua
e detonou um vulcão
que ainda continua.
Naquela noite correu
um lobisomem na rua.
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O pobre Grilo criou-se
pequeno, magro e sambudo,
as pernas tortas e finas,
a boca grande e beiçudo.
No sítio onde ele morava
dava notícia de tudo.
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Um dia a mãe de João Grilo
foi buscar água à tardinha.
Deixou o Grilo em casa,
que quando deu fé lá vinha
um padre pedindo água,
Coisa que ele não tinha.
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João disse: - Só tem garapa.
Disse o padre: Donde é?
João Grilo lhe respondeu:
- É do Engenho Catolé.
Disse o padre: Pois eu quero.
João lhe levou a coité.
(coité: cabaça, cuia)
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O padre tomou e disse:
- Oh, que garapa da boa!
João Grilo falou: - Quer mais?
O padre disse: - E a patroa
não brigará com você?
João falou: Tem canoa!
(Tem canoa: tem muita.)
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João trouxe outra coité
naquele mesmo momento.
Disse ao padre: - Beba mais,
não precisa acanhamento.
Na garapa tinha um rato
bem podre e bem fedorento.
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O padre gritou: - Menino,
tenha mais educação.
E por que não me disseste?
Oh natureza do cão!
O padre pegou a coité
e arrebentou-a no chão.
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João Grilo disse: - Danou-se.
misericórdia, São Bento!
Com isto a mamãe se dana,
me paga mil e quinhentos.
Essa coité, seu vigário
é da mamãe mijar dentro!
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O padre soltou um arroto,
disse para o sacristão:
- Este menino é o diabo
em figura de cristão.
Meteu o dedo na goela,
quase vomita o pulmão.
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O NAMORADO ZÉ PITADA
Autor: Leandro Gomes de Barros.

Zé Pitada era um rapaz
que em tempos idos havia.
Amava muito uma moça,
o pai dela não queria.
O desastre é um diabo
que persegue a simpatia.
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Pois João Mole, o pai dela,
era um velho perigoso,
mesmo que o Zé Pitada
dissesse ser corajoso.
Adiante o leitor verá
quem era o mais valoroso.
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Disse Pitada a Marocas:
- Eu preciso lhe falar.
Já tenho toda a certeza
que eu vou te raptar.
À noite espere por mim,
que havemos de contratar.
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Disse Marocas a Zezinho:
- Papai não é brincadeira.
Diz Zé Pitada: - Ora essa,
pois sou da mesma maneira.
Você pode ver-me as tripas,
porém não verá carreira.
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- Diga que hora hei de vir,
que dou conta do recado.
Inda seu pai sendo fogo,
por mim será apagado.
Eu juro por minha alma,
que seu pai morre assombrado.
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Disse Marocas: - Pois bem
eu espero e podes vir;
porém, encare a desgraça,
se acaso meu pai nos vir.
Meu pai é de ferro e fogo
e duro de resistir.
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Marocas desconfiada
e querendo experimentar,
olhou para Zé Pitada
fingindo querer chorar.
Disse: - Meu pai acordou
e nos ouviu conversar.
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-Valha-me Nossa Senhora,
respondeu ele gemendo.
- Que diabo eu faço agora?
E caiu no chão tremendo.
- Oh, minha Nossa Senhora,
a Vós eu me recomendo.
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Nisso um gato derrubou
uma lata na despensa.
Ele pensou que era o velho.
Gritou: - Oh, que dor imensa.
Parece que estou ouvindo
Jesus lavrar-me a sentença.
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- A febre já me atacou.
Sinto frio horrivelmente,
com muita dor de cabeça,
uma enorme dor de dente.
Tá me dando erisipela.
Já sinto o corpo dormente.
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- Antes eu hoje estivesse
encerrado na cadeia,
do que morrer na desgraça
e de uma morte tão feia.
Veja se pode arrastar-me,
que minha calça está cheia.
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- Por alma de sua mãe,
pela sagrada paixão,
me arraste por uma perna
e me bote no portão.
A moça quis arrastá-lo,
não teve onde por a mão.
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Ela tirou-lhe a botina,
para ver se o arrastava,
mas era uma fedentina
que a moça não suportava.
Aquela matéria fina,
já todo o chão alagava.
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Disse a moça: - Quer um beijo,
para ver se tem melhora?
Ele, com cara de choro,
respondeu: - Não, não senhora.
Beijo não me salva a vida.
Eu só desejo ir-me embora.
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Então lhe disse Marocas:
- Desgraçado, em bem sabia
que um ente do teu calibre
não pode ter serventia.
Creio que foste nascido
no fundo da padaria.
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- Meu pai ainda não veio,
eu hoje estou bem sozinha.
Zé Pitada ali se ergueu
e disse: - Oh, minha santinha.
A moça meteu-lhe o pé
dizendo: - Vai-te, murrinha!
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Então a moça gritou:
- O senhor lave o quintal.
Veja esta tabica aqui!
Lave por bem ou por mal.
Covardia, para mim,
é crime descomunal.
(tabica: chicote)
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E lá se foi o rapaz
se arrastando com a lata.
A moça bem perto dele,
lhe ameaçando a chibata.
Ele exclamava chorando:
- Por Deus, você não me bata!
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- Vai, miserável de porta,
quero já limpo isso tudo.
Um homem da tua marca,
pequeno, feio e pançudo,
deve ter sido criado
onde se vende miúdo.
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Disse o Zé, quando saiu:
- Eu juro por Deus agora.
que mesmo sendo uma moça,
filha de Nossa Senhora,
e olhar pra mim eu digo:
- Desgraçada, vá embora!...

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2 comentários:

  1. Cara , Sabe como Consigo o Livro " a Vida e testamento de Cancão de Fogo " Volumes 1 e 2 ?
    Ajuda aê
    Um abraço

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  2. Muito massa. Chorei rir

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