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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O ouro de Moscou. (Parte I)

Síntese do livro "Camaradas' de William Waack. Editora: Companhia das Letras. O autor, na época correspondente da Rede Globo de Televisão na Europa, debruçou-se sobre os arquivos da KGB (polícia política russa) quando a URSS ruiu (1991), para obter informações soviéticas sobre a marcha do comunismo no Brasil, já que a nação só conhecia os depoimentos de comunistas como Prestes sobre o assunto. Evitava-se falar sobre o malsinado ouro de Moscou, que Prestes nunca reconheceu ter recebido para financiar suas atividades em prol da União Soviética no Brasil. Desta alentada pesquisa saiu este livro revelador e realizado com incrível competência histórica.
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O autor, William Waack, na foto em Belgrado em 1999, quando cobriu a guerra de Kosovo. Paulista de 1952, é formado em jornalismo pela USP.
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"O século XX é o século dos cretinos fundamentais, ineptos e sem humildade. Para cada gênio existem dez milhões de imbecis. A burrice é a grande característica do ser humano." (Nelson Rodrigues).
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01. Os sobreviventes do Hotel Lux.
A Internacional Socialista ou Komintern existiu de 1919 a 1943. Foram realizados sete congressos no decorrer de sua efêmera existência. Eram as reuniões em que os comunistas do globo vinham tomar a bênção do "paizinho" Stalin e debater em Assembléias o futuro risonho do socialismo. Delegações de comunistas do mundo inteiro se hospedavam no Hotel Lux, na rua Twerskaia, em Moscou. Hoje o hotel se chama Central, cada vez menos faustoso e habitado por ratos.
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A Terceira Internacional, na década de trinta, começou a mostrar especial interesse pelo Brasil.
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Desde a fundação do Komintern por Vladimir Lênin em 1919, até a extinção por Joseph Stalin em 1943, esta organização produziu verdades tao infalíveis para lugares tão diferentes como a Escandinávia ou o Havaí, mas a grande maioria de seus comandados jamais tomou o poder em parte alguma.
O Komintern atendia aos interesses exclusivos da URSS, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Na verdade, na década de trinta, quem tomava as decisões nos congressos, sempre alinhadas com a vontade de Stalin, era a chamada OMS, Pequena Comissão do Komintern (Serviço de Ligações Internacionais), formada por três membros:
- O finlandês Otto Kusinen, responsável pela América Latina;
- O soviético Dimitri Manuilski, ligação do Komintern com o Partido Comunista Soviético.
- O soviético Jossif Piatnitski, que cuidava das finanças e do serviço secreto.
Os discursos dos comunistas estrangeiros no Komintern eram cosméticos. Todas as decisões sempre foram tomadas pela OMS, após ouvir Stalin. Tal serviço se revelava o coração secreto do Komintern. Fazia falsificação de passaportes e elaboração de rotas internacionais, de entrada em países ou fuga deles, controle de agentes e informantes, codificação e decodificação de mensagens, codinomes e nomes falsos de agentes. Financiava os partidos comunistas em outros países, incluído o Brasil. Liberava verbas do governo soviético para células em Berlim, Amsterdâ, Copenhague, Nova York, Londres, Paris, Xangai, Rio de Janeiro. O salário de Luiz Carlos Prestes era pago pela OMS com verba soviética (1.750 dólares mensais), nos anos anteriores à Intentona de 1935.
Luiz Carlos Prestes (1898-1990). Morreu afirmando nunca ter recebido salário dos soviéticos.
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02. O ouro de Moscou.
Luiz Carlos Prestes, comunista convicto, jogou pistas em direções erradas, incentivou mitos, adaptou papéis para sua versão oficial da tentativa de golpe contra o presidente Getulio Vargas. Prestes, desertor do Exército Brasileiro (era capitão), na Bolívia tomou contato através leituras em francês (língua que dominava), com a ideologia comunista de Marx, Engels e Lênin.
Dona Leocádia Felizardo Prestes, mãe de Luiz Carlos Prestes, caráter forte e independente para sua época, teve cinco filhos, Prestes e quatro irmãs, de três homens. Casou-se com o primeiro, o capitão do Exército Antônio Pereira Prestes, pai do "cavaleiro da esperança". Luiz Carlos, nascido em Porto Alegre em 1898, tinha dez anos quando o pai morreu. Ele, depois da morte da companheira Olga Benário (comunista alemã, agente da KGB a serviço de Stalin), casou-se com Maria Ribeiro, que o acompanhou com fidelidade por quarenta anos. Olga morreu num campo de concentração nazista, extraditada por Getúlio para a Alemanha de Htler. Isso não impediu que Prestes o apoiasse em 1950, quando retornou à Presidência após vitória nas urnas.
Prestes afirmava que as mulheres tinham mais disposição que os homens para realizar coisas. No entanto, não gostava de mulheres intelectualizadas. Era personalista e ficava sozinho por horas. Considerava-se o comandante militar da revolução brasileira.
Prestes, em Janeiro de 1930, mantinha contatos com Getúlio e dele recebeu oitenta mil dólares para comprar armas e apoiá-lo na tomada do poder naquele ano. Ele não participou da Revolução de Trinta e nem devolveu o dinheiro a Getúlio, pois queria aplicá-lo na sua própria revolução.
Fundado em 1922, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) de Prestes se manteve subordinado a Moscou até 1991. A maioria de seus militantes vinha do anarco-sindicalismo. Astrogildo Pereira era o representante do comunismo brasileiro para o Komintern.
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Documento do Komintern de autoria de Jossif Piatnitski (janeiro de 1930) exigia que o PC brasileiro marchasse sozinho, condenando qualquer aliança com outros partidos. Exigia a luta contra o imperialismo e o confisco de terras estatais para distribuição aos camponeses. Parecia um decreto-lei, irreal para o Brasil, que recomendava o expurgo do partido de "elementos direitistas". Tal recomendação de um estrangeiro, que nem devia conhecer o Brasil, deu margem a que fossem afastados do PCB os intelectuais Otávio Brandão, Astrogildo Pereira, Leôncio Basbaun e Paulo Lacerda. Foram substituídos por "trabalhadores".
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Getúlio Vargas e a esposa Darcy em foto de 1911, quando ele advogava no Rio Grande do Sul.
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Em 1925 era instalado em Buenos Aires o Secretariado Soviético para a América Latina, dirigido pelo ex-pastor protestante Jules Humbert Droz. Era auxiliado por Vitório Codovilla, chefe do PC argentino, com quem Prestes manteve os primeiros contatos. Este Secretariado foi a origem do BSA (Bureau Sul-americano), ligação entre Moscou e os partidos comunistas da América Latina. Abraham Guralski (o rústico), judeu nascido na Polônia, foi o primeiro chefe do Bureau. Através dele o PCB recebia dólares de Moscou, mas com a determinação precisa de como gastá-los.
Os fundos de Prestes (80.000 dólares) foram fundamentais para financiar as atividades do Komintern e do Bureau para a América Latina até o final de 1933. Foram distribuídos de acordo com critérios soviéticos. Ironicamente, Getúlio fornecia a Moscou, via Prestes, parte dos fundos utilizados para derrubá-lo em 1935.
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"Ele é um bom organizador e conhece seu país. Nossa tarefa é prepará-lo para ser um membro da nossa família". (carta de Ewert a Moscou sobre Prestes).
Prisioneiros de um gulag (campo de concentração soviético) no trabalho em 1936 (era Stalin).
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Luiz Carlos Prestes parte para Moscou em Setembro de 1931, lá chegando a 07 de novembro do mesmo ano com a mãe e as irmãs. Ninguém os esperava na estação. Mais tarde, eles iriam para o Hotel Lux. Ali ficaram pouco tempo e passaram a ocupar um apartamento na rua Pancratievskaia (apto 129).
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