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domingo, 17 de junho de 2012

CONTRA TODA ESPERANÇA XI.



presídio da ilha de Pinos.
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Do livro de Armando Valladares, ex-preso político de Castro.
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Alfredo Izaguirre, preso de consciência como eu, tinha decidido, depois de uma análise que comentou comigo na cela,  não trabalhar forçadamente nunca. Sabia que se arriscava a ficar mutilado ou até que o matassem de pancada, mas sua decisão era irrevogável.
Quando o puseram na cela de castigo, o deixaram sossegado por dois ou três dias. Depois desse tempo foram buscá-lo. Da circular vimos Alfredo escoltado por um pelotão que o levou até o fundo do quartel, por onde passava uma vala que era percorrida pela águas servidas dos banheiros e latrinas. 
Queriam que Alfredo movimentasse para frente, com uma lata, os excrementos que se acumulavam nas beiradas da escavação.
O tenente Porfírio Garcia, chefe da Ordem Interior, sabia que era uma questão de princípio. Precisava quebrar a resistência dele. Alfredo negava-se até mesmo a tocar na lata.
A primeira coisa que fizeram foi rebentar a lata na cabeça dele. Os presos viam tudo da circular. Parecia até que os carcereiros desejavam isso, para nos intimidar.
E começou uma surra brutal. A lâmina de uma baioneta soltou-se ao bater-lhe contra a testa. Depois da primeira sessão de pancadas, o tenente Porfírio voltou a insistir, tentando convencê-lo que seria bem melhor. Nova surra. Pararam de bater e prometeram levá-lo para Havana, o que todo preso desejava, tal o terror em Pinos. Mas Alfredo, com o rosto já todo ensanguentado, resistiu. Furiosos, foram batendo nele com as culatras dos fuzis, até que ele perdeu os sentidos. Agarraram pelos pés e mãos e o jogaram num jeep.  Das circulares 3 e 4 dezenas de olhos aterrorizados acompanhavam a tortura selvagem.
Resolveram tirá-lo do jeep e o jogaram no chão. Foi quando apareceu o doutor Agromonte, novo médico militar do presídio, acompanhado por outro de pequena estatura. Foi este que agachou-se, levantou Alfredo, apoiando-o no joelho, para examiná-lo. Alfredo ficou nu, somente com as botinas. Via tudo, mas não conseguia falar.
- Precisamos levá-lo já.
Jogaram-no novamente no jeep e se foram, levando-o para a enfermaria do presídio.
Quando ele voltou, era a imagem de um quase morto. Estava com o osso do nariz quebrado e várias contusões e ferimentos pelo corpo inteiro. Uma das baionetadas havia pegado na dobra da nádega, quando estava deitado de barriga para baixo apanhando. O ferimento fechou como abriu.
Ele continuou mal. Administraram-lhe soro. Quando o deitaram de costas o ferimento da nádega abriu e começou a sangrar. O sangue gotejava no chão. Alfredo já estava em coma, nos umbrais da morte. A surra bárbara o deixara com ferimentos enormes no corpo inteiro. A inflamação do rosto e o derrame pela pancada que lhe fraturou o nariz formaram olheiras completas, violáceas. Mesmo assim o devolveram à cela de castigo.
Alfredo Izaguirre foi um preso político que não prestou serviço nenhum nem por um minuto, nem por um segundo. Morto sob a tortura mais sangrenta, seu nome passou para a História da rebeldia do presídio político cubano.
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E dizer que, no Brasil, o partido hegemônico, a par de querer a desforra pela surra que levou no Araguaia, idolatra o facínora responsável por tantas mortes e torturas em Cuba. Se comparados a ele e seus capangas, os militares brasileiros não passaram de cândidos seminaristas. Dona Ideli Salvati voltou de Cuba encantada.
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